Humildade de recomeçar do zero: Meu primeiro emprego no Canadá como Babysitter
Se você está planejando vir embora ou se você acabou de chegar no Canadá, SAIBA DE UMA COISA: você precisa recomeçar.
Salvo várias exceções, você precisa chegar e procurar um novo emprego. Se você veio acompanhando um marido, uma esposa, que veio estudar, você precisa arranjar um emprego e precisa arranjar algo pra fazer. Como conhecer pessoas? Como se comunicar com elas quando o inglês ainda não é fluente? Eu digo e repito: Traga a humildade na mala junto com você. Ela será a bagagem mais essencial de todas para não se frustrar, não se sentir completamente infeliz e querer voltar - desistindo de um sonho, de uma meta.
Não é fácil recomeçar e se reinventar. Eu sempre me perguntei: "o que mais eu sei fazer? Profissionalmente falando?". A verdade era só uma: NADA. Eu não sabia fazer nada além de limpar casa, cuidar de criança (achava eu né!), ficar na internet e ADVOGAR. Eu entrei na universidade aos 16 anos, me formei aos 21 e aos 22 já era advogada. Trabalhei com a mesma coisa por mais de 10 anos. Aos 28 anos vim pro Canadá e não sabia o que fazer.
Como me reinventar? E agora? Que desespero. Até que ouvi de uma grande amiga - que estava na mesma situação que eu - "eu vou ser babá Mari, é a única coisa que eu sei e gostaria de fazer no momento para ganhar uma grana e não me sentir tão sozinha e inútil". E eu pensei: "vou fazer isso também! Quem sabe dá certo?".
Me inscrevi em um site canadense, completei meu perfil e fui verdadeira com todas as informações. Postei fotos de perfil com meus afilhados no Brasil e meus gatos - pra mostrar que também era "pet-friendly". Com 3 dias de anúncio, recebi o primeiro contato. Uma canadense precisava de mim por 2 horas naquele dia de tarde, ela estava desesperada por ajuda, um bebê de 8 meses. Eu não sabia andar em Calgary, que dirá usar o transporte público. Peguei um taxi e naquele dia, literalmente, paguei para trabalhar. Mas fui feliz, contente e nervosa.
Cheguei lá e ela tinha a minha idade praticamente. Jovem, bonita e desesperada. Ela ficou nervosa quando viu que meu inglês era muito limitado. Eu tentei tranquilizar ela dizendo que eu entendia tudo que ela falava, mas expliquei que meu contato com o inglês era bem precário, mesmo morando aqui - eu havia chegado no Canadá há 1 mês e meio!
Ela me deixou 2h com a criança, eu brinquei, troquei fraldas e ainda coloquei pra dormir. Ela voltou como uma águia e desde aquele dia, me chamava 3 vezes por semana, por períodos maiores. 4 a 5 horas sozinha com ele. Eu fui melhorando meu inglês, ela foi me ajudando muito. Me corrigia, me ensinava e me deu o que eu precisava: uma oportunidade de começar.
Acabei conhecendo a família toda e os amigos - eles faziam altas festas em casa e eu ia pra lá só pra controlar o sono do pequeno, para eles não terem que ficar subindo e checando o sono dele. Os turnos da noite eram os melhores para mim! Netflix a noite toda (eu colocava ele pra dormir e ele seguia feito um anjinho por 12/13 horas seguidas) e jantava por lá. Eles me traziam sanduíches, pediam sushi e eu não precisava lavar nem uma caneca.
Que fique bem claro que isso não é a regra pra babysitter - EU DEI MUITA SORTE. Eles me pagavam extremamente bem, na época o salário mínimo era de $13 a hora, eu recebia $35. Ou seja, não precisava fazer tantas horas por semana. Até que ela começou a me indicar para todas as amigas e eu trabalhava 9h por dia, 7 dias por semana. Eu queria fazer uma graninha pra poder voltar a estudar aqui. Eu cheguei a trabalhar com 12 crianças na agenda - uma por turno algumas vezes. Foi muito legal!
Começou a ficar muito pesado pra mim e ela precisava de mais horas e eu não tinha pra oferecer. Então fizemos um acordo de ela me pegar 4 dias por semana e 3 noites por semana/fim de semana - aí fiquei por 11 meses exclusivamente na casa deles.
Que tempo bom. Eu fui embora porque engravidei da Beatrice e ela engravidou do segundo bebê. Eu tive algumas ameaças de aborto no início da gravidez então precisei parar. Até hoje somos amigas, nossas filhas brincam juntas de vez em quando. Eu aprendi muita coisa com ela e com a família deles. Sou eternamente grata pela oportunidade.
E como as pessoas encaravam isso? "Mariana largou o escritório para limpar bunda de criança". "De que adianta morar no Canadá e ser babá".
Eu arranjei muita briga por conta disso. Eu dava um valor tão grande para aquele trabalho, foi tão importante para o meu crescimento e desenvolvimento pessoal. As pessoas no Brasil não faziam ideia da minha felicidade - era um meio para um fim.
Confesso que foi muito difícil me despir dos meus próprios preconceitos, enraizados dentro de mim, e assumir o "meu novo trabalho" no Canadá.
Eu tinha vergonha, não vou mentir. Eu via amigos prosperando na profissão - virando Promotores, estudando pra ser Juiz, passando em concursos públicos, Advogando... e eu ali, lutando dia a dia pra aprender uma nova língua, ganhar meu dinheiro suado e poder recomeçar do zero.
Não foi fácil ouvir piadas dos outros sem achar que estavam me magoando. Não foi fácil lidar com a chacota. Imaginar o que os outros estavam pensando e rindo da minha situação - Eu aprendi a abstrair muita coisa, eu precisei.
Mas a verdade é que a gente precisa manter o foco no que a gente veio/vem buscar aqui. Recomeçar do zero é essencial para o nosso aprendizado, para dar valor a cada nova conquista que a nossa nova vida nos proporciona. Não é feio, não é vergonhoso - isso tá dentro da nossa cabeça. Aqui no Canadá ninguém tá nem aí! A gente quer mesmo é que o amigo prospere e se sinta feliz.
Aqui você recomeça e não é ninguém. Não tem referência nenhuma. É do zero mesmo, reconstruindo tudo. É uma boa oportunidade para quem quer se reinventar. Se você está vindo achando que vai chegar e achar o melhor emprego do mundo, na sua área de atuação, repense e revise todas as suas pesquisas. Não é assim.
Depois desse trabalho, fiquei em casa por 14 meses com a Beatrice e resolvi que era hora de voltar a trabalhar. Comecei a trabalhar como vendedora em uma loja de chocolates e fui promovida a Manager - gerente da maior loja deles no Canadá. Fiz muita coisa errada, aprendi com meus erros e comemorei cada acerto. E quem serviu de referência para esse trabalho? A moça que me deu a primeira oportunidade aqui no Canadá: de ser babá do filho dela.
Depois disso eu comecei a trabalhar para outra empresa do mesmo seguimento de comidas/doces e hoje trabalho no escritório deles. Meu primeiro emprego de babysitter segue lá no meu currículo e a referência é sempre a primeira a ser contactada.
Hoje eu sou extremamente e imensamente agradecida por cada momento que me fez aprender algo diferente, por cada momento difícil que eu aprendi a contornar. Sou agradecida por cada oportunidade que eu tive por aqui. E sou agradecida por ter aprendido a não deixar nada passar por mim.
Ter sido babá por aqui, depois de tantos anos de estudos para ser Advogada no Brasil, é um dos meus maiores orgulhos. Eu nunca trabalhei tanto, me desafiei tanto como no meu começo de Canadá, há quase 5 anos atrás.
Humildade é um dos requisitos de admissão para imigrar.
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Até o próximo!